Entrevista: Pedro Pereira (Exhale the Sound)

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Em pouco menos de um mês, o Exhale the Sound chegará à sua terceira edição e, apesar da crise, ao que tudo indica, vem com força total. Desde sua estreia, o festival vem mostrando um força crescente em sua proposta inicial: apoiar e divulgar todo tipo de arte “torta” que viva no underground. Rot, Herod, Carahte
r e Huey são alguns dos nomes que já pisaram no palco do festival. Em 2015, os shows acontecem nos dias 6 e 7 de novembro, em Belo Horizonte (MG) e, para manter a curadoria de peso, traz grandes nomes do independente brasileiro como Deaf Kids, Social Chaos, Necro e os portugueses grindeiros do Besta.

O ETS também promove outras manifestações artísticas que não só os shows, com feira de publicações, venda de merch das bandas participantes, presença de selos e distribuidoras de discos e uma mostra de artes. Tudo feito e movimentado por quem sobrevive de forma independente. A gente trocou uma ideia com o idealizador do festival, Pedro Pereira, para saber um pouco mais sobre como andam os preparativos para essa terceira edição e o que podemos esperar desse evento que já figura entre os principais acontecimentos do underground brasileiro. Segundo Pedro “em 2015, o Exhale the Sound será dedicado a um guerreiro do subterrâneo que nos deixou muito cedo. Em memória de Clecio José”. Motivos não vão faltar pra fazer dessa edição algo especial e celebrativo.


Sounds Like Us: Fala um pouco dos motivos que te levaram a criar um festival em um país como o nosso, onde toda forma de cultura independente vive apenas da vontade de quem faz e respira esse tipo de cultura. Como começou, quando e por quê?
Pedro Pereira:
Em 2013 um amigo agitou um show do Deaf Kids aqui em Belo Horizonte e, na ocasião, pude ajudar na produção. Vendo como era os corres, pensei em fazer um evento com umas cinco bandas que queria ver, mas nunca tinha visto. As cinco bandas viraram 22 e assim foi o primeiro Exhale the Sound. Desde o início, a proposta do festival é mesclar, em um só evento, sonoridades até então distantes umas das outras mas que, por algum atalho, poderiam se aproximar, criando um ambiente de interação entre pessoas que estão à margem e que buscam, de alguma forma, sair da rota convencional em que a maioria absoluta se encontra.

Sounds: Em 2015, o festival vai para a terceira edição. Voltando no tempo, qual era sua intenção quando você pensou em fazer o Exhale the Sound?
Pedro: Basicamente fazer os shows das bandas que eu queria ver (mesmo não dando para ver muita coisa). Misturar as vertentes sonoras que me agrada e de alguma forma, ampliar o alcance desse tipo de música/arte para um maior número de pessoas e colocar pessoas com interesses em comum em contato umas com as outras.

Sounds: E quais foram as dificuldades e aprendizados nas edições anteriores?
Pedro: A dificuldade maior sempre é o lado financeiro. Infelizmente em nenhuma das edições conseguimos sanar os nossos custos, e isso com certeza é um fator que pesa na hora de fazer o evento. Esse ano estamos trabalhando com uma verba menor para tentar tornar o festival viável, e para que ele não pare de existir. Os aprendizados são constantes, desde a concepção do evento até hoje. Para citar alguns podemos falar sobre a estrutura física do local em que irá ser realizado o festival. Na primeira edição, o lugar era pequeno demais para o número de pessoas que compareceram e não tinha nenhuma área externa, o que tornou o lugar quente como o inferno. Devemos oferecer, no mínimo, equipamentos de qualidade para as bandas que se dispõem a entrar nessa empreitada. E criar uma atmosfera saudável/acolhedora tanto para o público quanto para as pessoas envolvidas na produção e as bandas.

Sounds: Lembro dos primeiros comentários dizendo que o Exhale seria um festival dedicado à música torta. Onde entra esse adjetivo? Pergunto porque ele pode denotar tanto que uma música é torta por ter vários contratempos e ser algo mais quebrado, como também pode ser torta porque é um tipo de música mais fora da curva do underground convencional.
Pedro: O “torta”, no caso, é por se tratar de um tipo de música underground que ainda não tem muito espaço no Brasil. Mas esse é o lugar onde queremos estar. Às margens, na resistência.


Sounds: Você tem ou já teve algum incentivo para fazer com que o festival aconteça?
Pedro: Incentivo financeiro nunca rolou. Todas as edições foram bancadas com o dinheiro dos corres do dia a dia. O incentivo que faz o festival acontecer são principalmente dois: as bandas, que compram a ideia do evento mesmo sabendo que não podemos oferecer muita coisa e mesmo assim topam participar; e o público, principal força motora do festival e que desde a primeira edição acreditou na nossa proposta, nos ajudando ao compartilhar ou falar sobre os shows nas mídias sociais e, principalmente, comparecer ao evento.

Sounds: De quem é e como funciona a curadoria que seleciona as bandas que vão tocar?
Pedro:
A curadoria das bandas em sua maioria é feita por mim e por indicações de pessoas próximas. Não existe um critério definido para a escolha das bandas, mas sempre prezamos pela qualidade musical e pelo espirito “correria” das pessoas envolvidas. Outro fator importante na escolha do lineup, desde a primeira edição, é mesclar as sonoridades “pesadas” e “leves”.


Sounds: Existe alguma razão específica para selecionar quais bandas tocam em um dia ou no outro?
Pedro: A ideia principal é tentar fazer com que as pessoas venham nos dois dias do evento. Com isso tentamos imaginar quais bandas elas querem ver e que as “obriguem” a ir nos dois dias.

Sounds: Mais que música, o festival também oferece diversas formas de manifestações artísticas que não vivem sob a luz do mainstream. Você já tinha algum tipo de ligação com esses outros tipos de arte? Como são selecionadas as publicações que também farão parte das atrações do festival? É curadoria sua também?
Pedro: Minha ligação sempre foi com a música e consequentemente o universo que fica nas redondezas dela (cinema, artes, publicações…). Esse ano a curadoria da mostra de artes será feita pelo artista mineiro Thiago Pena, que irá fazer a seleção dos materiais para a exposição, além de expor seu trabalho.


Sounds: Você acha que manter o mesmo local ajudaria a criar um certo tipo de cultura no público? Existe uma dificuldade em manter o local do fest ou é uma ideia sua mesmo ter essa rotatividade, para que cada edição ser realizada em um local diferente?
Pedro: Infelizmente é muito difícil achar um lugar em BH que seja ideal em todos os aspectos. Ou ele é muito caro, muito longe ou muito pequeno. Sempre trabalhamos com as opções que temos disponíveis, buscando o melhor para o público. O local da primeira edição era muito pequeno, por isso não rolava de fazer lá novamente. O da segunda edição tem o espaço ideal para o festival além de ser no centro da cidade, mas a administração não comprou a ideia do evento, o que impossibilitou a realização esse ano.

Sounds: Fala um pouco sobre essa terceira edição? Quais os shows mais aguardados, quantas bandas por dia, estrutura…
Pedro: Esse ano, assim como no ano passado, o evento será realizado em dois dias. No dia 6 de novembro iremos receber na Casa do Jornalista cinco bandas. Já no dia 7 teremos dois palcos no Espaço Nook, uma área para exposição e a presença de 14 bandas, sendo sete por palco. Na sexta, a Casa do Jornalista, que abriga 250 pessoas, conta com uma área fechada onde serão realizados os shows e uma área aberta onde serão montadas as banquinhas das bandas e a área de exposição. No sábado, o espaço conta com 4.000 m2, com estacionamento próprio, espaço para camping e bastante área aberta. Além disso, o bar será operado pelo festival, o que irá proporcionar preços mais em conta para o público, além de opções veganas pra a galera.

Sounds: De todas as edições, quais foram as maiores roubadas que rolaram? Tem alguma história bizarra que você lembre e queira dividir com a gente? Alguma banda já desistiu ou não aceitou tocar…
Pedro: Na primeira edição, poucos dias antes do festival, o dono do local onde seria realizado o evento me liga falando que os shows da parte de cima teriam que acabar às 22h (o cronograma ia até as 5h da manhã). Com isso tivemos que improvisar um teto para abafar o barulho, e o lugar ficou mais quente ainda. Tivemos bandas que cancelaram a apresentação no festival: O Mito da Caverna, Josh Making Songs, Subterror e Expurgo.


Sounds: Entre as edições que já rolaram, quais os shows que mais te surpreenderam?
Pedro: Kroni (uma das primeiras bandas que chamei pro festival), Huey (tinha acabado de chegar de algum corre na rua e o som dos caras tinha começado, não arredei o pé até o final do set), Subterror (já passava das 4 da manhã e foi como um soco na cara), Monge (sem palavras para descrever, o que acho que foi um dos melhores shows que já vi por terras brasileiras), ROT (histórico! Primeira vez em BH em 25 anos de carreira) e Expurgo (quem já viu um show dos caras sabe do que eu tô falando). Infelizmente não vi vários shows do festival, mas tenho certeza que a maioria deles foi tão foda quanto esses que citei.

Sounds: Até onde você quer que o Exhale the Sound vá? E até onde você acha que ele realmente vai?
Pedro: No plano imaginário queria que o festival fosse uma espécie de Roadburn/Maryland Death Fest brasileiro, com bandas de todas as partes do mundo, mas infelizmente sei que isso é utópico. Até onde o Exhale the Sound pode chegar depende de N fatores, desde questões pessoais até questões de viabilidade. No formato que o festival é hoje, creio que ele está no ponto mais alto em que se possa estar. Bandas de qualidade e público fiel, mesmo que pequeno.

Sounds: Você acha que o Exhale the Sound foi responsável por revelar alguma banda?
Pedro: Creio que não, até mesmo porque o nosso alcance ainda é irrelevante a ponto de atingir um número considerável de pessoas. Mas acredito que o festival seja de alguma forma um incentivo para a disseminação e criação de coisas novas e relevantes na música em que estamos inseridos.