Aqui é a Amanda assinando este texto – e com um orgulho danado!
Certas canções evidenciam que muitas das nossas buscas na vida são mais saboreadas e significadas pela jornada do que pela conquista em si. Não é o minuto final que conta para nós a história detalhada das nossas impressões, mas, sim, o percurso particular de cada nota, cada acorde, cada som ecoando em nossos ouvidos.
Conversando com o Huey – banda formada por Dane (guitarra), Minoru (guitarra), Rato (bateria), Vellozo (baixo) e Vina (guitarra) – sobre o novo disco, Ma, lançado nesta terça-feira (6) pelo selo Sinewave, a gente percebe que cada composição revela o inesperado das jornadas, evidenciando assim as múltiplas e incontroláveis possibilidades de um processo criativo.
Ma é o sucessor do Ace, uma estreia bastante aclamada em 2014, e risca novos movimentos e linguagens em uma gramática ainda mais aprimorada. A produção impecável do norte-americano Steve Evetts (produtor de nomes como Dillinger Escape Plan, Sepultura e The Cure), que gravou a banda ao vivo no estúdio paulistano Family Mob Studios, lapidou a força e o espírito desbravador do Huey e acentuou as essencialidades de cada música, juntamente à masterização de Alan Douches. Minhas impressões são de que a banda abraça as melodias mais declaradamente neste disco. É também um álbum de faixas mais compactas, mas sem prejuízo das dinâmicas tão impressionantes que o Ace apresentou. Cada movimento sonoro dentro das faixas escancara a pluralidade de referências e de códigos dos cinco integrantes, deixando ainda mais perceptível a diversidade sonora do Huey. É uma banda afeita a avalanches tanto quanto a contemplações. Estas são canções que iluminam uma trajetória – uma linda e poderosa trajetória, eu diria. Tem tanta perseverança e confiança mútua nestas músicas que arrisco dizer que juntas elas escrevem uma história de resistência.
Com este discão saindo do forno, aproveitei para fazer um faixa a faixa com 4/5 do Huey – o Fe (Vellozo) não pode estar com a gente na entrevista porque estava levando a mensagem de “Wine Again” ao Chile – e, assim, esmiuçar alguns dos significados de cada música. E o melhor de tudo: dá pra ouvir e dar as boas-vindas às suas próprias percepções enquanto se lê, e conferi-las ao vivo no show de lançamento, que vai rolar no dia 16 de março, no Centro Cultural Rio Verde, em São Paulo (mais detalhes no pôster ao fim da entrevista).
1- “Inverno Inverso”
Sounds Like Us: Pra começar nosso faixa a faixa, conta por que vocês escolheram essa música pra abrir o disco?
Dane: A gente queria começar com uma música mais direta, com riff marcado, sem uma introdução.
Vina: Foi uma das últimas que fizemos. Vínhamos até conversando que começar por ela seria algo diferente do “Ace”, que é um disco onde as músicas têm bastante introdução, climão etc. Acho que a “Pei” e a “Inverno Inverso” são um pouco o resumo do que é o disco.
Sounds: É curioso ela ser uma das últimas músicas que vocês fizeram, só que já resumia o que vocês estavam começando a entregar…
Dane: É legal porque ela começa parecendo algo simples e depois entrega um clima, como se fosse uma introdução.
Sounds: Teve alguma coisa de vocês quererem subverter expectativas?
Dane: Pra gente, a palavra deste disco é impacto. A gente queria que fosse uma coisa marcante. As músicas, a capa, o nome do disco, o motivo das ordens das músicas. A gente queria que as pessoas identificassem isso tudo de um modo rápido.
Vina: E o riff já entrega isso. Ele é simples, marcante e objetivo. É cantável [cantam o riff]. Ficamos na dúvida se ela ou “Pei” abririam um dos lados do disco.
Minoru: É uma música onde todo mundo está meio que fazendo uma parede mesmo.
2 – “Wine Again”
Dane: Esta é legal porque, diferentemente da Inverno Inverso, começa num clima e você não sabe se vai ficar assim o tempo inteiro ou se vai ter alguma quebra. E é legal falar que as mídias físicas sempre pautaram como as músicas eram feitas. Ou seja, em um disco de vinil em que cabem por volta de 20 minutos de cada lado, você tinha que pensar em como colocar aquelas músicas ali. Aí veio o CD com 74 minutos seguidos de música. Já hoje em dia – o que eu acho demais, mesmo a gente que ama o vinil – é infinito. Seu disco pode ter um minuto ou quatro horas. A mídia física não interessa mais. A gente ainda tem pensamento de Lado A e Lado B, de pensar na transição de uma música pra outra, então escolhemos a “Inverno…” para ser a primeira, seguida por “Wine Again”. Mas não foi unanimidade. Conversamos bastante sobre isso. Só de falarmos sobre isso já é uma coisa muito legal do processo de fazer um disco, e acho que muita gente deixou de fazer isso hoje em dia. Talvez por não terem uma nostalgia, pois nossa formação musical foi com LP e fita. Hoje em dia é uma compilação de singles, né? Também não vejo problema nenhum nisso. Mas, pra gente que faz o disco, escolher a ordem é um processo maravilhoso.
Sounds: Vocês têm essa pira de classificar as músicas pela ordem? Por exemplo, eu tinha essa pira de que, em um disco, as músicas dois, cinco e sete eram os hits hahaha.
Dane: Tem o limite físico mesmo. A área do vinil, pra última música por exemplo, é menor. As últimas músicas perdem um pouco a qualidade. Então, vamos colocar uma música mais leve no final do lado A ou B. E vamos abrir com uma mais porrada.
Sounds: A “Wine Again” foi o segundo single. Como ela nasceu, como foi construída e que tipo de palavras foram sendo associadas?
Vina: A gente tava tomando muito vinho… hahaha. E isso é culpa do Estevam, do Desalmado… hahaha.
Dane: A parte mais lenta o Vina trouxe e eu tinha o riff do final.
Vina: Ela é uma soma disso mesmo. Brincando com a guita em um dia de ensaio, saiu esse looping. Aquilo me soou interessante e fiquei repetindo. O Dane tinha já a outra parte, e vínhamos brincando com ela há um tempo. Era aquela coisa de gostar muito do riff, mas ele não tinha abertura pra algo que pudesse ser construído antes ou depois dele. Era só ele. Aí, todo mundo junto meio que amarrou essas partes e ficou bem foda.
Dane: O que eu acho legal é que a gente não tem pudor. A gente coloca a música no meio da roda. A gente joga um riff, uma melodia, uma ideia. Na “Wine Again”, só o meu riff não era uma música. Só o do Vina também não. A gente divide mesmo.
Vina: A gente divide pra somar mesmo. O riff sozinho não existe, não dá um som.
Dane: E os detalhes que cada um acrescenta mudam a música inteira.
Vina: A gente costuma dizer que cada um traz um esqueleto mesmo. E um esqueleto não se sustenta sem músculo, fibras, nervo, então, a gente vai preenchendo. Se a gente não alimenta, ele é facilmente quebrável.
3 – “Pei”
Sounds: Eu tenho uma visão do Huey como uma banda cinematográfica mesmo, e ouvindo o Ma, ele é tipo um plano sequência, sabe? Tudo se encaixa, é muito ensaiado. Já as músicas possuem cortes secos, que é onde entra a parte do imprevisto. Acho que o Ma trouxe novas modalidades de se fazer isso. O Ace trazia isso quase de uma forma mais didática e o Ma faz isso mais melodicamente…
Dane: A gente nunca pensa racional ou estrategicamente na música. Nunca.
Vina: E é em cima do que a gente sente, por isso não tem nada de racional. A Pei tem muito disso que você falou mesmo. Eu vejo ela bem plano sequência. Acho que é mais bem amarrada.
Dane: Tem uma diferença fundamental quando você já tem banda há algum tempo. No momento que a gente tá agora, pegamos tudo que absorvemos a vida toda e transformamos em alguma coisa. Quando se é mais moleque, é uma coisa mais direcionada. Quando se é mais jovem, se você gosta de Ramones, você vai querer soar igual ao Ramones. Hoje em dia a gente tem tanta referência que não sabe de onde estão vindo todas elas.
Sounds: É difícil decupar as referências, né?
Dane: Falando por mim, o que eu ouço hoje é tudo, menos música pesada. É muito mais pop, rap, música brasileira…
Vina: Acho que, quanto mais o tempo passa, a maturidade te ajuda também a se desprender de certas coisas. E ao despreender de querer seguir algo, você acaba se permitindo ser um eterno ignorante, que é esse lance de aprender sempre.
Sounds: Vocês chegaram a olhar para a “Pei” como um expurgo? Porque ela começa mansa, mas depois ela explode…
Dane: Não é consciente. Outro dia eu tava ouvindo o disco, indo pra Boituva, e pensei “como que a gente chegou nisso?”
Vina: É bem isso. Eu tenho uma sensação de que é quase como sair do próprio corpo… hahaha.
Rato: É bem isso mesmo.
Dane: A gente não pensa num objetivo. Se vamos fazer uma música longa, pesada, climão… ela simplesmente sai. E se todo mundo gostou, é isso! Todo mundo coloca sua parte e é muito foda como cada um acrescenta. Um detalhe de baixo, guita ou bateria muda a sensação inteira que você tem daquela música. Quer mais que a batera definindo a velocidade? Quando você faz um riff na guitarra, tá pensando num tempo. Quando você vai mostrar para a banda e o Rato dobra aquele tempo ou toca mais lento, mudou a sensação da música.
Sounds: Imagino que o Rato (baterista) mexa bastante com os tempos que vocês imaginam…
Vina: Eu penso um pouco no riff já com a batera.
Dane: É, o Vina é o que mais pensa na batera. Pra ele é uma coisa meio natural. Eu não penso, o Minoru também não. Isso que faz a diferença também. Ele pensou em algo na batera, mas o Rato pode dizer “acho que não”. E isso que é legal, essa surpresa. E tem esse lance, por ser uma banda instrumental, não existe um protagonismo. O Fe é um puta compositor também. O baixo ali não é um mero seguidor da linha de guitarra.
Vina: Exato. Muito pelo contrário.
Dane: É, muitas músicas partem do baixo. Essa aí é um exemplo [Mother’s Prayer].
4 – “Mother’s Prayer”
Vina: Acho que foi na “Mother’s Prayer” que o Steve [Evetts, produtor do disco] falou que lembrava Soundgarden.
Dane: A gente não pensa em nenhuma banda, mas aí vem alguém de fora e fala isso. Aí você fala “é, pode crer”. Essa surpresa é legal.
Sounds: E é só depois que vocês começam a delimitar as partes das músicas, né? Porque imagino que para vocês, que vivem esse processo, é até difícil de separar parte a parte.
Rato: Dá pra você transformar sempre.
Vina: É. A música é da pessoa que tá lá no público. Ali tem outra percepção além da sua, que acha que a música parece com a banda X ou Y.
Sounds: É a parte que entra a nossa participação como ouvinte.
Dane: É como se a gente estivesse pintando um quadro de olho fechado. Você sai pintando e, quando abre o olho, você fala “caralho!”. Pode ser horrível e pode ser legal. Aí você mostra pra alguém. É a sensação de surpresa. Essa semana foi muito emblemática. Eu ouvi o disco inteiro. E é louco, porque ele quase envelhece antes de nascer, né?
Minoru: Eu tava falando isso pro Vina, eu tô evitando ouvir por enquanto… hahaha.
Dane: É engraçado, porque é o que falam de estar inspirado, né? “Ah, vocês estavam inspirados…” E inspirar é isso, né? Você puxa o ar, solta e, quando você solta, entrega para os outros. A gente não tem domínio nenhum. Por isso nesse período de pré-lançamento estamos querendo muito saber o que as pessoas vão sentir, porque a gente já sente há tanto tempo.
Rato: A gente quer que as pessoas sintam isso que a gente sente, ou mais até. Ir além disso.
Sounds: A “Mother’s Prayer” é bem melódica, né?
Vina: O Rato que deu o nome pra ela.
Rato: Tem um significado de reza, oração, lembra minha mãe…
Dane: Acho que é um respeito do que é importante pra cada um. E mãe dele sempre reza por ele.
Sounds: Ela tem uma carga dramática, de você olhar pra dentro, de buscar introspecção e de ser bem pensada. De novo, tem aí a coisa de vocês trabalharem com o imprevisível…
Dane: Total. É engraçado o lance instrumental porque abre ainda mais a criatividade. Quase sempre os nomes vêm da sensação que a música te dá.
Sounds: É quase uma associação livre mesmo, né?
Dane: É. A “Mother’s Prayer” tem o lance da mãe do Rato, “Pei” é um termo que o Vina adora usar e tem a ver porque a gente pensava “pô, essa música é pei, é porrada”.
Dane: A gente diverge em um monte de coisa como banda. Mas algumas coisas importantes, como o nome, deixamos para ver depois. Aí o Minoru veio com o nome Ma e foi unânime, o que me deixa mais feliz.
Sounds: O nome Ma tornou o disco conceitual, pois todas as músicas têm uma história de ênfase no intervalo.
Rato: Impressionante isso, né.
5 – “Adeus Flor Morta”
Sounds: “Adeus Flor Morta” saiu em 2016 e agora acompanha as novas composições. Vocês veem mudanças de composição entre ela e as novas?
Vina: Eu acho que não, sabia? Acho que ela é quase uma ponte entre os dois momentos e conversa muito bem com o que a gente fez quase um ano depois.
Minoru: Ela é bem uma mistura do Ace com o Ma.
Vina: E a acho bem conturbada. No começo dela, a ideia era que fosse bem claustrofóbica mesmo. Era o momento. O riff era pra transmitir algo preso, mas ela virou uma ligação ente os dois discos e só percebi isso no final.
Rato: Foi. Eu, você e o Fe a fechamos num ensaio de sábado.
Vina: Foi isso mesmo. Eu tinha o riff e a gente lá, tomando umas brejas e tal. Aí o Fe fez o final ali no estúdio mesmo. Ele puxou uma linha mais stoner e a ficou foda. E só fez sentido mesmo depois que tava tudo misturado. Acho que a nossa música só dá pra entender depois que ela tá pronta.
Rato: A gente nunca sabe muito pra onde vai.
Sounds: Em que momento que vocês estabelecem que “fechou, pronto, não entra mais nada”?
Minoru: Acho que não tem este fechamento porque, por exemplo, no Ace, a gente mudou várias coisas.
Vina: É, sempre pode mudar alguma coisa.
Minoru: Esse ponto que você falou é meio quando a gente tá confortável com a música.
Dane: Eu já percebi que algumas músicas ficam 80% prontas e tem só uma parte em que a gente fica “hum, não sei”.
Vina: Como essa música!
6 – “Mar Estar”
Vina: A “Mar Estar” foi isso. Ela demorou pra virar de fato uma música.
Dane: Aí quando vira, ninguém mais questiona aquele momento da música.
Sounds: É quando se traduziu o sentimento.
Dane: A gente não pensa numa música do Huey como uma obra. É mais uma experimentação de caminhos. A gente valoriza muito o processo.
Sounds: É um disco de jornada, né?
Dane: É exatamente isso. A gente aproveita cada momento em que a gente tá junto, compondo. A gente não pensa no resultado final. Valorizar o processo é fundamental.
Sounds: Vocês comentaram antes que, até o disco sair, ele já foi ouvido exaustivamente, o que é natural em uma gravação. Mas vocês já conseguiram retornar àquele ponto de se emocionar música a música e de detectar sentimentos novos?
Dane: O que mais me impressiona é que toda vez que eu ouço, me emociono.
Vina: Tem muito isso. Mas acho que o ensaio talvez me emocione mais. A emoção do disco é diferente. É mais em detectar resultados diferentes a cada ouvida. Às vezes mínimos, outros maiores, mas sempre com mudança.
Rato: Acho que o ensaio emociona muito, e o disco também.
Minoru: É, os dois mesmo.
Dane: Acho que o importante de gravar ao vivo é que a gente é isso aqui. Lapidado, claro, com cuidados de captação, execução, mas é a gente. Todo mundo que vê nossos ensaios diz “é isso aqui, vocês precisam levar isso aqui pro disco”. Ouvindo o disco, a gente consegue pegar todas as guitarras, o baixo, a batera, e é isso que a gente toca ao vivo. Se você vê o Huey ao vivo, é o disco. É a verdade absoluta.
7 – “Fogo Nosso”
Sounds: Toda uma intimidade que a banda está expondo e a gente, ouvindo…
Dane: A gente só consegue fazer de um jeito, que é a nossa fórmula. Não é a única ou a melhor do mundo. Não é a certa ou a errada. É que a gente não consegue tocar sem se olhar.
Vina: O Huey é uma banda para se ver ao vivo. Seja no ensaio, gravando, show… é ao vivo.
Minoru: E isso aí o Steve falou. Quando a gente começou a gravar, tava todo mundo meio durão. Aí ele falou “porra, vocês têm que tocar em pé, têm que se olhar…”
Dane: Ele conseguiu potencializar muito o que a gente é.
Vina: O Steve entendeu a vibe da banda e a gente o respeita muito. Ele sacou também que a gente é muito um complemento um do outro. O conselho dele foi meio “caras, façam o que vocês já fazem sempre”. Foi meio por aí. Ele amplificou o que a gente é.
Rato: Ele sacou também o jeito de cada um.
Dane: E teve muito respeito pelo som. A gente respeita muito o trabalho dele, pelas bandas com que ele já trabalhou… Nossa, o quanto ele foi cuidadoso pra falar alguma observação porque ele sabe que a música não estava sendo feita por ele, né?
Vina: E no grau que ele tem de bom gosto e experiência, ele sabe que o toque dele vai deixar a música mais foda.
Sounds: Eu acho interessante que as pessoas não conversam muito nos shows de vocês. Elas realmente estão interagindo com a música.
Dane: Isso é curioso. Não tinha percebido isso. Eu acho que é querer estar no momento. No ensaio, a gente quer estar ali, naquele momento. No show, a gente que estar ali, naquele momento. E se as pessoas querem estar com a gente nesses mesmos momentos, então a gente atingiu o nosso objetivo e sucesso da vida. Seja pra três pessoas, 300 ou 3.000. Se quem tá lá se sente parte disso, ótimo.
Sounds: Na gravação vocês tiveram momentos em que precisaram insistir mais?
Vina: Sim. A gente separou os dias de gravação de acordo com o grau de dedicação que cada música ia precisar.
Dane: Por exemplo, a “0+” é uma música longa, tem nove minutos. Gravando ao vivo, tudo tem que ter a mesma intensidade. Então pra batera é cruel você ficar oito horas descendo a porrada. Guitarra e baixo, a gente pode tocar sentado, mas pro Rato é oito horas de trampo físico.
Rato: Eu já tava com tesão e mau humor misturados… hahaha.
Dane: Por exemplo, gravando ao vivo, se todo mundo acertar e eu errar, ninguém quase nem ouve. A real é meio isso. Só que você sabe “pô, eu posso tocar melhor”. “Gente, vamos fazer mais uma?” Em nenhum momento alguém falou que não ia fazer. Isso é foda de gravar ao vivo. Tem a cumplicidade do momento.
Vina: E você tá realmente dividindo. Compartilhando olhar para tocar bem. Tanto que, quando a gente parava no meio de uma música, era no sentido de “eu posso fazer melhor” e nunca “putz, fiz cagada”. O tocar errado não entra em pauta. A gravação ao vivo é o ápice da cumplicidade mesmo. Você joga pro time, mesmo.
Sounds: E a origem do nome desta música, “Fogo Nosso”?
Minoru: É uma homenagem à Fuego [estúdio onde a banda ensaia]. A gente chegou a cogitar que o nome do disco fosse Fuego.
Dane: A Fuego era uma produtora e a estrutura teve que ser simplificada – a gente cogitou até entregar a casa. Só que o estúdio sempre foi muito importante pra gente. O lance de não ter nada cronometrado, um ambiente nosso, de relaxamento também, tomando nossa cerveja, sem pressa. A gente pensou em como poderíamos continuar com a casa e aí o Fe se mudou pra lá, começamos a alugar os outros quartos e deu tudo certo pra manter o estúdio.
Vina: De certa forma, o Fe salvou o rolê.
Rato: É Fe, eu te amo! Hahahaha.
Sounds: Pelo que você comentam, este processo de composição com espaço para agregar as coisas que forem surgindo precisa de tempo e intimidade…
Dane: É por isso que ela se chama “Fogo Nosso”. Aquele lugar é algo nosso. A gente pertence àquele lugar.
Rato: Tanto que é que quase foi o nome do disco.
Dane: É um lugar que fez a gente ser o que é como banda. Às vezes a gente vai ensaiar e não toca… hahaha. Várias vezes. A gente tá junto. É fogo nosso mesmo, nosso porto seguro, de a gente se encontrar e tal. Pô, quatro dias antes de a gente entrar em estúdio pra gravar, estávamos exatamente aqui, na casa de vocês, tomando uma, conversando. É uma satisfação estar junto e isso se reflete no disco.
8 – “0+”
Sounds: E a “0+”?
Vina: Essa é viagem do Fernando.. hahaha.
Dane: Essa é ele progressivo, Rush, Iron Maiden…
Vina: Eu adoro essa música. Bom, toda música eu vou falar que é foda… hahaha.
Dane: A gente fala progressiva, mas é mais por ela ter uma progressão mesmo e nem tanto a ver com o estilo rock progressivo. Ela é uma história mais completa mesmo.
Minoru: O Fe é o mais musical de todos nós.
Dane: Ele tem tanta música que às vezes tem quase quatro músicas dentro de uma só. Muito elemento musical dentro de um som.
Minoru: De todas, essa é a música que tem mais texturas mesmo.
Vina: Ela é meio como a “Por Detrás de Los Ojos”, do Ace. Outra que quando a gente foi gravar foi um dia inteiro só pra ela.
Sounds: E vocês estão preparados pra ver o filho cair no mundo agora?
Vina: Acho que por nós a gente já teria arremessado o filho pro mundo faz tempo. [risos]
Dane: A magia toda tá aí também. Tem o processo da pré, de fazer o disco, e quando chega essa fase de lançamento, é quase um renascimento.
Vina: Porque pra gente fica velho mesmo. Criar, compor, gravação, a ordem das músicas, pensar na capa… o resultado disso agora vai ser um lance novo.
Dane: O impacto que as pessoas vão ter é um renascimento dessas músicas mesmo. Eu quero chegar nas pessoas e perguntar “e aí, que sensação essa música te dá? O que esse disco te passa?”. Porque pra mim, é muito único. Eu queria dizer que estar no Huey me faz uma pessoa muito melhor, um músico melhor. Sem o Huey eu não atingiria nem a metade do que eu poderia ser. Me enxergo muito pequeno fora da banda. No Huey eu me vejo muito pleno.
Vina: Teve uma vez que a Helga, uma amiga nossa, disse que era louco como o nosso som incluía quem tava ali vendo, do público. E a gente traz pra perto mesmo. Então acho que, se a gente conseguir, com esse disco novo, fazer com que a galera ainda se sinta parte do que estamos fazendo, isso é o “dar certo”.
Dane: Eu acho que o que move é a admiração. Eu tenho admiração por quem eu tô perto. Quando você perde isso, fodeu! O resto a gente conserta.
Minoru: Tem uma coisa que eu aposto: a gente nunca vai se ver ao vivo. A gente nunca vai saber como é ver o Huey ao vivo.