METALLICA 30 anos em 10 depoimentos sobre a importância de Master of Puppets

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Você já parou para pensar sobre o tempo que alguns discos permanecem ao nosso lado? Alguns passam longos e longos anos com a gente. Mudamos de casa, gostos, visões. Aprendemos a lidar com perdas, conquistas, doenças. Casamos, separamos, casamos de novo e no meio de toda essa história lá está ele, aquele disco que, em nenhum destes acontecimentos abandonou o posto (ou a estante). É uma relação tão íntima que dá até um certo receio escrever sobre porque sempre vai existir a sensação de que algumas palavras vão escapar entre uma vírgula e outra.

Em uma época onde a maquiagem era o artifício usado pelas bandas para um certo escapismo da realidade americana, o Metallica, levantando a bandeira do ainda jovem thrash metal, chegou despido de qualquer alegoria, com letras que tratavam sobre guerra, perdas e a paranoia que flertava com a realidade Reagan.

Eram quatro caras, vestidos igual aos seus amigos e tocando mais rápido do que todo mundo. Era fresco, ameaçador, revigorante. O Metallica causou uma revolução.

James Hetfield (guitarra/vocal), Lars Ulrich (bateria), Kirk Hammett (guitarra) e Cliff Burton (baixo) estavam no auge. “Disposable Heroes” e sua palhetada à velocidade da luz; a faixa título e “Lapper Mesiah” brigam pela vaga de predileta. Isso sem mencionar as clássicas “Welcome Home (Sanitarium)”, “Battery”, a linda “Orion”, “Damage Inc.” e “The Thing That Should Not Be”.

Para celebrar esse grande clássico, convidamos músicos, artistas e fãs para dividir suas histórias com esse grande disco que segue envelhecendo com qualidade e relevância irretocáveis.

Foto: Sounds Like Us

“Alegria e tristeza. Há 30 anos, o Metallica estava tomando seu espaço e caminhando rumo ao topo do heavy metal mundial. Entretanto, o mundo parou quando o baixista Clifford Lee Burton, o “headbanger mais hippie do metal” e responsável por fazer o grupo se mudar de Los Angeles para São Francisco, se foi. O Metallica estava promovendo Master Of Puppets, seu disco de maior impacto até então. Cliff tinha uma performance frenética. Era preciso e solava em seu Rickenbacker como se estivesse empunhando uma guitarra. Sempre negando o status de rockstar, ele estava cumprindo bem a sua missão até que um acidente com o tour bus em Ljungby (SUE), ocorrido a 27 de setembro de 1986, pôs fim à sua trajetória. Assim, a euforia de estar se transformando em um nome do mais alto escalão do metal – fato que efetivamente ocorreu anos depois – deu lugar à tristeza. Até hoje muitos se perguntam qual teria sido o futuro do Metallica se o baixista não tivesse falecido. Portanto, sempre que você agitar e gritar “Master! Master!”, lembre-se também do velho Cliff. Coloque para rodar a instrumental “Orion”, de Master Of Puppets, e depois confira o vídeo Cliff ‘Em All (87). Afinal, to live is to die… And justice for all”.
Ricardo Batalha (Revista Roadie Crew)

“O Master Of Puppets pra mim é o melhor disco do Metallica. Lembro que o Ian, meu primo, bem antes de a gente pensar em tocar juntos com o Diesel, tinha, assim como eu, esse disco no topo da nossa ideia de som pesado. Tudo que a gente queria na vida naquela época era conseguir tirar um som de guitarra com aquela textura “grossa”. Engraçado pensar que o disco foi uma grande influência pra mim mas não como batera, mais como banda. Escutei o disco milhares de vezes, mas nunca parei pra “tirar” ou tocar as músicas, sempre escutei como espectador e não como músico. Apesar de ter dividido o palco com o Metallica algumas vezes e, de certa forma, ter perdido um pouco daquele sentimento de ver a banda como algo inatingível, ainda escuto o disco hoje e tenho uma nostalgia boa e um resquício daquele sentimento do quão pesado aquilo soava pra mim naquela época”.
Jean Dolabella (Ego Kill Talent / Family Mob Studios)

“A primeira vez que eu ouvi o Master of Puppets foi dentro da van durante uma turnê. A gente estava indo para uma longa turnê pelos Estados Unidos e fizemos uma última parada para pegar o Jim Martin, antigo guitarrista da banda. O Cliff Burton tinha dado para o Jim uma fita cassete com a mixagem final do Master e a gente colocou pra tocar imediatamente na van. Eu amei aquilo logo de cara. Achei o Metallica uma banda muito poderosa na época e eles nos apoiaram muito, o que pra mim foi uma honra. Eu ainda coloco esse álbum como um dos maiores!”
Billy Gould (Faith no More)

“Eu me dirigia à minha mãe como Master. E quando eu queria dar ênfase a alguma palavra eu fechava o punho da mão direita e levantava o braço duas vezes repetindo, no Natal por exemplo, Chester, Chester. Eu vivi esse disco intensamente. “Weak are ripped and torn away” “Blood will follow blood. Dying time is here” . Da primeira à última frase, no volume máximo, repetidas vezes. Em 95 eu tinha uns 13 anos e eu ouvia os discos na ordem em que me foram apresentados. Conheci a banda com o Black Album. Namorei algumas melodias, letras, mas queria conhecer o Metallica que meus amigos cabeludos aclamavam. Foi nessas que tomei um tapa na orelha de um walkman amarelo, ouvindo uma fita emprestada. “Cara, que porra é essa! ”. O disco mais completo do estilo começa seu Lado A revisitando Kill´em All com “Baterry”, segue com a porrada que dá nome ao disco, a pesada “The Thing That Should Not Be” e fecha com a balada “Welcome Home (Sanitarium)” (*minha balada favorita do Metallica, deixo claro, é “Fade to Black”). Costumo ser fã dos lados Bs e nesse caso não é diferente. O pedal duplo e desafiador para qualquer batera de “Disposable Heroes”, o melhor nome de música ever em “Leper Messiah”, a maravilhosa “Orion” e o meu solo favorito do James, e a mistura de “Damage, Inc”. James e Kirk desenharam músicas que ganham de obras-primas como “Don´t Trust” do Kreator, “The skull beneath the skin” do Megadeth. E Lars, ah que saudades da época em que você tinha cabelo… hahaahaha. Master of Puppets teve muito mais efeito em mim que o And Justice for All…, Ride the Lightning e Kill’em All. Explodiu minha cabeça me jogando de vez no mundo thrash”.
Patricia China (Volume Máximo)

“O Metallica lançou o thrash metal em 1983, com o disco Kill’em All. Pavimentou o caminho com Ride the Lightning e definiu o estilo com Master of Puppets. Quando esse disco saiu, todas as bandas de metal que vieram antes pareciam velhas. As que vieram depois pareciam tentar ir atrás, tamanho o estrago. Tudo ficou pequeno. O disco é uma moeção só. Rápido, pesado, impensável, surpreendente, genial. Traduzido em músicas complexas que são simples de entender. A mágica está aí. Conseguiram fazer um álbum arrematador, definitivo e fácil de ouvir. Os headbangers sacaram isso, fazendo desta obra-prima um dos discos mais amados do thrash metal. Começa FODA, continua FODA e termina MUITO FODA. Desnecessário falar das canções, todos conhecem e o disco já foi tocado na íntegra pelo Metallica e por outras bandas também. Se você não sabe quais são, vá estudar. Quer aprender sobre metal? Vá conhecer Metallica. Quer entender o thrash metal? Vá entender Master of Puppets. E toque essa porra ALTO toda vez que for ouvir”.  
Jo (Chaosfear)

“Eu ouvi bem no mês em que saiu. Uma amiga conseguiu um vinil importado, duplo. Ela passou em casa, escutei e fiquei hipnotizado. Eu já curtia muito o Ride the Lightning, que pra mim mostrou um Metallica diferente, mais trabalhado, com músicas como “The Call of Ktulu” e “Fade to Black”. O Master of Puppets é uma continuação dessa nova cara, com músicas que você sente a influência do Cliff Burton, uma coisa mais erudita, em músicas como “Master of Puppets” ou “Orion”. É um disco revolucionário que colocou o Metallica no ponto mais alto do heavy metal mundial. Até hoje ele influencia as bandas mais novas. Nos shows sempre tem músicas desse disco no set list. Talvez seja o melhor disco da banda, mas isso é uma coisa difícil de dizer porque tem quem prefira o lado mais thrash ou mais pop, mas acho que o Master of Puppets guarda tudo aquilo que o Metallica tem e teve de melhor. A partir daí começaram a realmente ser a banda gigante que eles são hoje.

Infelizmente o Cliff Burton morreu na turnê desse disco e a gente só pode ficar imaginando como seria se ele estivesse vivo. Era o cara que trazia essa originalidade de uma forma que nenhuma outra banda tem. Um baixista completamente único, que tocava de uma maneira diferente, solava, usava distorção, wah wah. Acho que o disco é o grande trabalho da vida dele.

Em 92, o James Hetfield sofreu um acidente no palco e queimou o braço de uma maneira muito brutal. Eles tiveram que cancelar um show no Canadá. Rolou até uma riot, quebraram tudo porque o Guns n’ Roses também não ajudou muito na ocasião e foi um tremendo caos. Logo depois o Metallica já tinha se reunido pra procurar um guitarrista pra continuar a turnê que era com o Guns n’Roses. Por meio do Phil Rind (baixista do Sacred Reich), que é muito amigo nosso e na época a gente morava tudo lá em Phoenix (EUA), o Jason Newsted, que também morava lá, comentou que eu era um grande fã do Metallica e sabia tocar todas as músicas. A gente escutava Metallica direto juntos. Aí eles abriram uma oportunidade pra mim.

Eu tava no Brasil e eles ensaiando em Denver, no Colorado. Comprei uma passagem e fui pra lá. Uma limusine me recebeu, tinha meu nome na lista e de vários outros guitarristas pra fazer o teste. Foi maravilhoso. Ensaiei com Lars Ulrich, Kirk Hammet, James Hetfield e o Jason Newsted e aí eles pediram pra eu ficar mais um dia. Na final ficamos eu e o James Marshall. Eu não tava familiarizado com o Black Album, que era um disco super novo, e não tava muito preparado em relação a esse material. Eles escolheram o James Marshall, que já tinha tocado com eles na turnê do Master of Puppets quando o Hetfield quebrou o braço andando de skate. A partir daí eu comecei uma amizade muito forte com os caras, eles curtiram muito minha maneira de tocar. Fiz várias demos, bandas com o Jason e desde então a gente tem esse respeito e amizade. Apesar de eu não ter ganhado a posição, tive o privilégio de ter ensaiado duas vezes lá com os caras. Foi surreal e guardo isso com muito carinho”.
Andreas Kisser (Sepultura)

“O tal do Master of Puppets, de 1986. Eu poderia falar da sensação que foi ouvir todas as músicas dessa belezinha. “Battery”, “Master of Puppets”, “Sanitarium”, “Disposable Heroes” (o começo dessa é um espetáculo), “Leper Messiah”, “The Thing That Should Not Be”. Que safra incrível de músicas complexas e rápidas! Mas eu vou falar de, e apenas de, “Orion”. Porque não era nada comum ter música instrumental nos discos que lançavam, e hoje é menos ainda. Aquela intro de cara me fez parar, olhar para o nada e ficar completamente quieto. Quando percebi, já estava balançando a cabeça e sorrindo, pois é, sorrindo. O tema hipnotizante desenvolve-se com a guitarras ditando a linha melódica, e eu apenas me deixei levar, como deixo até hoje. Então eles brecam e algo mágico e lento acontece. A linha de baixo, ah Mr. Cliff Burtton, eu te amo para sempre, obrigado por mudar minha vida. As guitarras entenderam tudo e apenas falaram o que devia ser ouvido. Que notas! E novamente Cliff entra em ação, num solo sentimental e técnico, afinal de contas, a música era dele. E vem a paulada final para terminar tudo em grande estilo! Eu jamais poderia imaginar que esse meu amor pelo som instrumental resultaria no que eu mais amo fazer hoje, que é tocar no HUEY. A vida e as suas surpresas são uma delícia mesmo”.
Vellozo (Huey / 23:13)

“Não vou mentir e dizer que comprei o então recém-lançado Master of Puppets numa tarde de sábado na Woodstock depois de ver um show do Harppia na porta. E nem poderia. Quando o disco saiu eu tinha 4 ou 5 anos e apesar de ouvir alguns relatos de amigos que já ouviam metal nessa idade, esse não é o meu caso. Na verdade, quando tive o primeiro contato com esse disco eu já tinha mais de 10 anos, Cliff Burton não estava mais entre nós, o Black Album já tinha sido lançado, o Jason estava careca e boa parte dos amigos mais velhos já acusava o Metallica de ter se vendido. Mas depois que o meu irmão – menos de 2 anos mais velho do que eu – apareceu em casa com aquele vinil comprado na Devil Discos debaixo do braço, muita coisa mudou pra gente. As sessões de metal com os amigos da rua ficaram muito mais intensas por causa do Master of Puppets. As primeiras reclamações dos vizinhos por causa do barulho vieram a partir desse dia. As minhas preferidas do álbum sempre foram “The Thing That Should Not Be” e “Lepper Messiah”, mas apesar dessa preferência, eu desafio qualquer um a gritar “Master! Master!” na sala de casa, como fazíamos lá em 91, e não se sentir mais poderoso. É daquelas coisas que te fazem estufar o peito e sair andando pela rua sem medo de nada. No fim das contas, o metal tem muito disso, de nos ensinar a não ligar pros tais julgamentos. E no meu caso, o responsável tem nome e sobrenome: Master of Puppets”.
Andre (Viagem Criativa)

“Usando de minha total sinceridade devo confessar que Ride the Lightning é o meu disco favorito do Metallica. Porém, alternando o tema para “álbum relevante de um estilo”, admito que Master of Puppets é a maior obra-prima do que conhecemos como thrash metal. É um álbum completo, possui desde músicas tocadas com velocidade impressionante a temas mais densos e cadenciados, mostrando não somente uma banda técnica, mas também ciente do papel pioneiro que desempenhavam na cena metálica até então. Não é nenhum exagero dizer que este álbum norteou o thrash metal e serviu de inspiração para milhares de bandas em termos musicais e visuais, afinal, ao se deparar com a contracapa, o impacto de suas fotos poderosas era avassalador para um músico em formação como eu. E certamente tantos outros sentiram o mesmo impacto. Repleto de merecimento, o aniversariante de 30 anos Master of Puppets conquista a atemporalidade dos clássicos e a supremacia dos eternos em oito faixas que dificilmente serão superadas por outra banda do estilo”.
Murillo Leite (Genocidio)

“Foi entre 88 e 89 que eu ouvi o Master of Puppets pela primeira vez, apresentado por um headbanger mais velho da rua. Lembro de me trancar com meu irmão no quarto para ouvir o disco com o volume no talo, minha mãe ficava maluca. Pra mim, neste disco, o Metallica estava no auge de sua criatividade e parece que tudo nele foi muito bem pensado, desde a capa, passando pela ordem das músicas, timbres e tudo mais. Os caras estavam executando seus instrumentos com maestria, comendo eles literalmente com farinha. Estavam conseguindo alcançar o mainstream, fazendo shows em grandes arenas e de quebra uma tour abrindo para o Ozzy, se destacando então entre as outras grandes bandas da época, como Exodus, Testament e claro, o grande rival, Megadeth. E o mais legal, se for pensar, é que o disco é praticamente um EP, pois tem 8 músicas, mas que são praticamente epopeias. Infelizmente foi o último disco do Cliff Burton, que para mim foi o gênio do baixo da música pesada e influenciou e influencia ainda gerações, inclusive a mim. Quando eu ouvi “Orion” pela primeira vez, foi algo difícil de explicar e até hoje fico imaginando como ele conseguiu tirar aquele som de baixo, unindo o peso e a harmonia em uma só música. Um fato muito legal foi que conheci o Misfits através dele, com a sua tatuagem e camiseta que praticamente fazia parte do seu corpo. Acho que ele dava essa cara mais suja ao Metallica e fico pensando, se ele estivesse vivo, como a banda soaria hoje em dia? Aliás, todos os fãs da banda devem se fazer essa pergunta”.
Helio Suzuki (Questions)