Elson (Herod/Sinewave) Que música tocou tanto, tanto, tanto, e ainda assim não esgotou seus ouvidos?

In Especiais

Chegou 2017 e com ele o primeiro post sobre aqueeeeles hits que tocaram até cansar, mas que, por algum motivo, não cansaram. E cada um tem seu hit preferido. Quer alguns exemplos? “Psycho Killer”, do Talking Heads (fa fa faaaa fa fa fa fafa faaaa); “Losing My Religion”, do R.E.M, ou “Rock and Roll All Nite”, do KISS. Até aquelas músicas de casamento podem entrar na brincadeira. “Dancing Queen”, do Abba, e a nossa dancing, ou melhor, “Dancing Days”, cantada pelas Frenéticas nas melhores festas e que faz muita gente soltar o pé de valsa adormecido. O importante é emocionar. Trazer de volta aquela sensação boa sempre que você ouve determinada música, mesmo que ela tenha tocado demais.

Nessa primeira edição do ano, nosso especial traz um convidado importante para a cena independente brasileira: Elson Barbosa. O cara que idealizou a Sinewave, um dos selos responsáveis por lançar muita banda boa no circuito independente, e que também divide seu tempo em outros dois projetos criativos: a banda Herod, onde toca baixo, e o podcast ouvido por muitos (mesmo que eles achem que não) O Resto é Ruído. Então, com a palavra, Elson.

Elson Herod“Je T’aime (Moi Non Plus)” – Serge Gainsbourg & Jane Birkin
Elson Barbosa (Sinewave / Herod)

Serge Gainsbourg desconhecia o conceito de pudor. Chocava a burguesia com músicas sobre perversões (“Lemon Incest”, em dueto com a própria filha, é chocante até hoje); convidava beldades como Brigitte Bardot e Jane Birkin pra dividir os microfones e os lençóis (não nessa ordem); se declarava à Whitney Houston em um programa de TV ao vivo com palavras não muito familiares (tem no YouTube); e, principalmente, fazia uma música com um estilo inconfundível de chanson francesa, funk, jazz e soul. Histoire de Melody Nelson (1971), seu melhor álbum, é um tratado de soul-funk tão branco, seco e francês quanto os melhores Chardonnays.

“Je T’aime (Moi Non Plus)” é seu maior clássico, e sua maior controvérsia. Para começar, teve que gravar duas versões distintas: a primeira em 1967, quando compôs e gravou com Brigitte Bardot, então sua amante, como uma legítima declaração de amor à atriz. A gravação foi imediatamente engavetada a pedido do marido de Bardot (acontece), e só lançada 20 anos mais tarde. É a segunda versão a mais famosa, regravada ao lado de Jane Birkin e lançada no álbum Jane Birkin/Serge Gainsbourg, em 1969.


Tudo em “Je T’aime” é safado. A batida e o baixo levemente dançantes, a guitarrinha seca, o órgãozinho canalha, a letra explícita, os sussurros e gemidos, tudo parte daquela estética cheesy setentista que a gente compartilha hoje com filtros sépias. Só que, apesar de ter virado piada, “motel music” e sinônimo de pieguice, “Je T’aime” é um tremendo hit, um pop classudo e psicodélico de primeira. O tom erótico e realista fez a música ser banida das rádios e censurada em diversos países, alimentando lendas como ter sido responsável por um aumento da taxa de natalidade no início dos anos 70, e a melhor de todas: que Gainsbourg teria escondido um microfone embaixo da cama para gravar o amor entre ele e Birkin. A resposta não poderia ter sido mais cafajeste: “Se fosse verdade não teria sido um single, mas um LP inteiro”.

A música ainda seria regravada diversas vezes, por duplas como Brian Molko e Asia Argento (em papéis trocados – ele cantando as partes femininas, e ela, as masculinas), Cat Power e Karen Elson em um dueto feminino (Madonna planejou gravar uma versão similar ao lado de Britney Spears), Nick Cave e Anita Lane (em versão que a revista CMJ chamou de “uma das piores covers da história”), e até Einstürzende Neubauten e Psychic TV gravaram suas versões. Mas nenhuma chega próximo da original. Aquele climinha barato e sem-vergonha só Gainsbourg sabia fazer.

* Aproveita e vê os hits que já passaram por aqui:
Fernando Augusto Lopes (Floga-se)
Magoo (Twinpines)
Liege (Medialunas)
Ulisses Freitas (Choldra)
serge